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O mercado nacional de Vinhos

por | abr 23, 2019 | Bebidas, Colunistas, Enologia

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Este artigo foi originalmente publicado em parceria com Regina Coeli C. Perrotta e Suely S. P. Quinzani, no evento Congresso Brasileiro de Turismo Rural em 2015, podendo ser obtido na íntegra nos sistemas de buscas virtuais sob o título de “Processo de regionalização gastronômica: uma análise do universo dos vinhos”.

Vitivinicultura é o processo ou desenvolvimento que envolve o cultivo ou a fabricação do vinho e a exploração econômica desse produto. De acordo com Albert (2012), em termos empresariais, o vinho nacional só ganha corpo no princípio do século XX, quando empresários pioneiros fundaram a Vinícola Mônaco (1908), a Salton e a Dreher (1910), e a Armando Peterlongo (1915). Depois surgiram as Cooperativas Rio-grandenses e a Cooperativa Forqueta (1929) e por último em 1931, as Vinícolas Garibaldi e Aurora, esta última, ainda hoje uma das maiores do País.

Neste período, a Serra Gaúcha firma-se como grande região vitivinícola, respondendo até hoje por 90% da produção nacional. Porém os maiores investimentos em vinho, só acontecem em 1974, quando a italiana Martini Rossi (vinho Baron de Lantier), a francesa Moët Chandon (espumantes Chandon), a canadense Seagran’s (produtora da linha Forestier) e a norte-americana Almáden se instalam no sul do País (ALBERT, 2012). Foram trazidas novas variedades de vitis viníferas como a Merlot, Cabernet Sauvignon, Cabernet Franc, Chardonnay, Sauvignon Blanc, Moscato e a Riesling Itálica.

Em 1998 é criado o IBRAVIN – Instituto Brasileiro do Vinho, para ordenar e integrar os diferentes elos da cadeia produtiva da vitivinicultura gaúcha e nacional. A entidade é uma associação sem fins lucrativos, à qual estão associadas pessoas jurídicas, de direito privado, representantes de produtores de uva, cooperativas, indústria vinícola e o governo do Rio Grande do Sul. O IBRAVIN representa junto ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) os interesses da vitivinicultura nacional diante da Organização Internacional do Vinho (OIV).

O ano de 2002 marca a consolidação da viticultura em várias regiões. Porém o Vale dos Vinhedos é a região primordial, que obtém em 2002 a Indicação de Procedência, enquanto Pinto Bandeira obtém a mesma certificação em 2010. Entretanto, é em 2012 que o Vale dos Vinhedos atinge a supremacia quando obtém a D.O. Vale dos Vinhedos que garante ao vinho nacional, produzido nesta área delimitada, “qualidade” e “procedência”.

O Rio Grande do Sul é quem produz 90% do vinho fino brasileiro e, portanto, a principal zona produtora. De acordo com a Embrapa (apud ALBERT, 2012) o Rio Grande do Sul possui 63% de sua área plantada, sendo 805 de uvas americanas e híbridas e 20% de uvas viníferas, caracterizado por duas macro regiões: a Serra Gaúcha e a Campanha Gaúcha.

A Serra Gaúcha, onde estão as cidades de Bento Gonçalves, Caxias do Sul, Flores da Cunha e Garibaldi, situa-se no paralelo 29°, com altitudes entre 600m e 1.000m. O terreno é montanhoso, de difícil mecanização, pelo fato de ser ondulado, o solo é ácido, argiloso e composto por arenito recoberto por basalto, enquanto o clima é temperado, com invernos frios e verões amenos e com alto índice pluviométrico (de 1.700mm a 2.000mm por ano). Portanto, as condições climáticas são parcialmente favoráveis à viticultura, pois tendo um inverno forte, possibilita um bom descanso para a parreira e boa insolação no verão para a frutificação e muitas chuvas também. Quando a natureza brinda a região com verões menos chuvosos, temos safras excepcionais como a de 1991, 1999, 2002, 2005 e agora 2012.

É a região onde os vinhos espumantes encontram um terroir perfeito. O excesso de umidade e a insolação um tanto deficiente fazem com que a região se assemelhe à Champagne, dando uvas com pouca concentração de açúcar e alta acidez, ideais para a produção de bons espumantes (ALBERT, 2012). Vários produtores se destacam como Chandon, Casa Valduga, Vinícola Salton, Miolo group, Cave Geisse entre outros.

O Vale dos Vinhedos, de acordo com Albert (2012) é uma subdivisão da Serra Gaúcha encravada entre os municípios de Bento Gonçalves, Garibaldi e Monte Belo do Sul. Os produtores dessa região criaram a Aprovale, órgão que zela pela qualidade do vinho da região mediante a observância de regras rígidas para que o vinho tenha o atestado de procedência. É nesta região que temos então o nosso primeiro vinho com Indicação de Procedência e em 2012 os produtores conseguem a Denominação de Origem (DO) Vale dos Vinhedos, a primeira do Brasil.

A Campanha Gaúcha, que se situa no extremo sul do País, próxima a fronteira com o Uruguai, engloba os municípios de Santana do Livramento, Dom Pedrito, Bagé, Quaraí, Herval, Candiota e Pinheiro Machado. Com topografia plana e de fácil mecanização, possui solo com menos acidez, de textura arenosa e boa drenagem. Situa-se no paralelo 31° e possui índice pluviométrico menor que a Serra Gaúcha, tem inverno rigoroso e verões quentes, o que propicia excelentes qualidades para a produção de vinhos. Tais condições, aliada ao preço mais barato da terra, tem atraído produtores como a Miolo e a Salton entre outros, sendo essa uma das regiões mais promissoras para a produção do vinho nacional.

Campos de Cima da Serra, localizada ao norte da Serra Gaúcha é uma região bastante fria, em razão da altitude (1.000m), mas que apresenta excelentes resultados para viticultura. Isto porque as amplitudes térmicas locais, ou seja, a diferença entre as temperaturas do dia e da noite em geral de 15°, favorecem o amadurecimento das uvas conferindo-lhes maior concentração de açúcares, aromas e sabores. A temperatura mais baixa possibilita uma maturação mais longa, beneficiando as estruturas do produto final – o vinho, enquanto a altitude maior provoca ventos que, na época da vindima, secam os vinhedos, baixando o risco de podridão oriundo de umidade.

A Serra do Sudeste, situada próximo à fronteira do Uruguai, engloba os municípios de Pinheiro Machado e Encruzilhada do Sul. Possui terreno arenoso-argiloso, com boa drenagem e índice pluviométrico baixo que são mais frequentes no inverno, destacando-se também uma ótima característica desta região, as amplitudes térmicas que lá ocorrem.

A Serra Catarinense, onde se fabrica os chamados “vinhos de altitude”, tem surpreendido o paladar de experts. Com vinhedos plantados a uma altitude entre 900 e 1.400m, e com temperatura muito baixa no inverno e a maior amplitude térmica do País, possibilita uma colheita mais tardia, o que favorece o amadurecimento das uvas e a qualidade dos vinhos, principalmente os produzidos pela Villa Francioni.

A região do Vale do Rio São Francisco, que abrange os estados de Pernambuco e Bahia, surpreende, se considerarmos que é uma região tropical, situada no paralelo 9°. Graças à irrigação fornecida pelo Rio São Francisco, a região é um polo de fruticultura. Com muita insolação, irrigação controlada, quase sem chuvas, pode-se conseguir 2,5 safras por ano, fato único na viticultura mundial. Tal façanha é conseguida com a interrupção da irrigação, o que provoca a dormência da parreira, fazendo com que a planta “entenda um inverno” e depois a poda, determinando o período da maturação das uvas.

Situada em plena caatinga nordestina, de clima semiárido tropical, existe nesta área um potencial de 260.000 ha irrigáveis, sendo que a região foi descoberta pela indústria Cinzano. A irrigação nesta região é fundamental para as videiras, pois o nível pluviométrico é em média de 450mm ao ano. Com solo plano, de fácil mecanização, basicamente sílico-argiloso, possui insolação alta (3.000 horas por ano), com condução das parreiras em latada, para que não haja um excesso de exposição das uvas ao sol, tornou-se um excelente local para produção de uvas, fazendo com que grandes viticulturas se instalem por lá como a Fazenda Ouro Verde e a Fazenda Milano. Porém, dado ao potencial de várias qualidades de uvas que a região pode produzir, não se limitando apenas a Moscatel e a Shiraz, que são uvas de clima quente, fez-se experiências com a Cabernet Sauvignon com excelentes resultados. Isto propiciou que empresários gaúchos, como o Grupo Miolo-Bentec, lá se instalassem para a produção de vinhos de qualidade, produzindo os vinhos da marca Terranova (Moscato, Shiraz e Cabernet Sauvignon).

Outras regiões brasileiras produtoras de vinho, com menor expressão devem ser citadas como Santa Catarina (Vale do Rio do Peixe), Paraná (no entorno de Curitiba), São Paulo (São Roque, Jundiaí, Vinhedo, São Miguel Arcanjo e Capão Bonito), Minas Gerais (Andradas) e o Ceará (Sobral), sendo que o presente estudo concentrou-se na análise do Vale dos Vinhedos, primeiro local brasileiro a receber o termo Denominação de Origem.

REFERÊNCIAS

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Bruna Mendes

BRUNA MENDES

Mestre em Hospitalidade, bacharel em Turismo e Licenciada em Pedagogia, mas acima de tudo, apaixonada pela cultura, turismo e gastronomia.

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